terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Parceria com O Impossível

“De novo? Não vai mudar de assunto? Esse negócio de parceria já está ficando um pouco chato repetitivo ...”. Peço perdão, mas a repetição, ainda que meio chata, ajuda a gente fazer duas coisas importantes: (a) firmar a memória – em uma época de tanta informação e tão pouco conhecimento, lembrar de que se trata quando falamos de algo, é fundamental; (b) inovar, experimentar, buscar novas descrições das velhas idéias, histórias ou discussões. Tendo oferecido minha auto-justificação, aí vai a repetinovação.

Fé, relação com Deus, tem tudo a ver com parceria. Mais; é parceria. Ser uma pessoa religiosa é ser uma pessoa parceira. Parceria, porque esta se define pela não-solidão, pelo não-individualismo; pelo companheirismo, pelo estar-com, pelo viver-para alguém que não eu mesmo, um outro, ou uma outra, ou quaisquer outras formas gramaticais de gênero que se tornem possíveis.

Parceria com O Impossível. O Impossível é outro nome de Deus. Deus faz as coisas impossíveis – esta frase se repete na Escritura, de variadas formas. Frase que está na boca de muita gente frequentadora de templos e outros espaços sagrados. Que será, porém, que dizemos quando afirmamos crer em O Impossível?

Para mim, não tem nada (ou quase nada?) a ver com o que costumeiramente ouvimos ou lemos. Não se trata de curar a dor de barriga, resolver o joanete, dar um jeito no casamento, aliviar a depressão, ganhar um dinheirão, progredir na vida, etc. Tais coisas pertencem ao mundo do possível. São coisas que dependem de nós, da cidadania, da alimentação, da previdência, da sorte. Não têm nada a ver com O Impossível.

Não tem nada (ou quase nada?) a ver com o aumento da arrecadação (de dízimos ou de impostos), nem com o crescimento da Igreja, muito menos com o decréscimo do paganismo, ou com a derrocada das religiões rivais, ou toda uma gama de coisas que encanta pastores, padres e fiéis, sejam quais forem os nomes que assumem tais agentes do sagrado nas religiões que disputam ferrenhamente o coração dos crentes – me desculpem: o bolso dos clientes!

O Impossível tem a ver exatamente com o impossível. O Impossível é aquela divindade que torna possível o impossível, que torna possível a virgem dar à luz, que torna possível o morto ressuscitar e não morrer mais, que torna possível o Império desmoronar, que torna possível às prostitutas e pecadores precederem os fariseus e santos no Reino dos Céus. O Impossível é a divindade que torna possível sairmos da esfera do Possível idolátrico, que nos ajuda a enxergar a banalidade (extremamente importante, mas banal) do Possível, nos ajuda a enxergar o que devemos fazer por nossa própria conta e risco, junto com as outras pessoas que cuidam do Possível.

E mais! O Impossível é aquele que nos carrega em suas asas para o espaço celestial do Impossível, da Impossibilidade possível, da Vida que transcende o tempo presente e o futuro viável, que cancela o passado e todas as suas forças repressoras, depressivas, neurotizantes, psicopatológicas.

O Impossível é a divindade que nos torna semelhantes a si mesma. Não iguais, mas semelhantes. Nós continuamos sendo gente do possível, mas libertada do Possível, para viver o Impossível, com O Impossível. O Impossível realiza em quem conviver com ele, o Impossível: amar impossivelmente a Deus acima de todas as coisas possíveis – amando todas as pessoas impossíveis de ser amadas pela gente do Possível.

Será possível?

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